"Mergulhado na penumbra daquele quarto, de olhos postos na sombra dele que se reflectia na parede, comecei a falar sobre a situação em que me encontrava. Abri o meu coração como não fazia há muito tempo e contei tudo o que havia para contar sobre mim, com a lentidão do gelo que se derrete, sem me preocupar com o tempo. Disse que a minha vida se estava a aguentar, mas sem chegar a parte alguma, ao mesmo tempo que me sentia a envelhecer. Quer era incapaz de amar alguém. Que nada me tocava nem eu tocava em nada. Que já não sabia o que procurar. Que procurava dar o máximo naquilo que fazia, mas que o esforço me parecia inútil. Que sentia a minha carapaça endurecer, os músculos a ficarem cada vez mais rígidos, e que isso me fazia medo. Que aquele era único lugar onde eu ainda me sentia ligado, por mais ténues que fossem os elos".
- Haruki Murakami, in "Dance, dance, dance"