É impossível a qualquer pessoa no seu juízo normal encontrar uma razão que justifique a overdose mediática da TVI a propósito da morte trágica do actor Francisco Adam. Não se entende qual a relevância do percurso do jovem a ponto de se transmitir em directo o funeral - uma cerimónia que não conquistou adesão popular à medida do exagero mediático. Percebe-se que a razão de ser de tudo isto é a notoriedade de um ídolo de uma série juvenil. Mas quando a notoriedade vale mais do que a substância temos de perguntar o que aconteceu à realidade. E a resposta é apenas uma: a realidade é engolida. Morreu um jovem actor; mas é o actor ou a personagem quem está no centro da encenação? A morte entrou sem pedir licença no universo de fantasia de Morangos com Açúcar. E a novela, tal como exportou uma banda de música para a vida real, importou o desaparecimento do Dino, esbatendo a fronteira entre ficção e realidade. Como acontecera com Fehér, a morte escapou incólume aos códigos de guerra do marketing. No luto televisivo, o pudor deixou de envolver a morte: tudo tem de ser exposto para que a ilusão continue. E a morte seja apenas um episódio que já passou.
- Miguel Gaspar, DN