Com o aproximar do referendo sobre a despenalização do aborto, começam a surgir os respectivos movimentos, pró e contra. E pela segunda vez em pouco tempo, voltamos a cair no extremar de posições, algumas das quais bem hipócritas, da parte dos promotores da boa moral e bons costumes. Escrevo sobre o assunto hoje depois da diatribe do bispo de Bragança-Miranda, comparando o aborto ao enforcamento de Saddam Hussein. Este é o nível a que chegou a discussão e ainda o período de campanha não arrancou.
Já temos as plataformas do não a espalhar em cartazes que vão ser os nossos impostos a pagar clínicas de aborto. Sem explicarem o que é uma clínica de aborto, muito menos como sabem a direcção em que vão seguir os legisladores. Ou então argumentam que a IVG vai ser utilizada como método contraceptivo. Como se um aborto fosse uma decisão tomada de ânimo leve. Gosto particularmente da plataforma "Não obrigada" (sem vírgula, não me enganei, ironia das ironias). Efectivamente, ninguém será obrigado a passar pelo sofrimento da interrupção voluntária da gravidez. Mas aqueles que o decidirem fazer estarão certamente mais protegidos por um sistema fiscalizado pelo Estado. E quem o decidir fazer, irá fazê-lo na mesma. Independentemente das católicas e bem formadas opiniões de quem prefere fingir que o problema não existe.
Isto para não mencionar que ninguém fala da real questão a referendar, que é uma questão jurídica e social. Quando os opositores do sim falam no assunto é apenas para dizer que a lei não é aplicada. Mas ainda há menos de um ano, em Aveiro, mulheres foram condenadas pela prática de aborto.
São estas mesmas almas que choram pelas crianças que morrem vítimas dos abusos dos pais. Que se sentem bem por dar esmola ao pobrezinho. E que colocam de parte todo o pensamento lógico de que a questão a referendo não é só uma questão de saúde pública. É uma questão de saúde moral. Ser contra o aborto não é o mesmo que ser contra quem aborta.